quinta-feira, dezembro 15, 2011

Transição tecnológica - o caso Android

Editorial da revista Linux Magazine #85 (Dezembro/2011)


Recentemente, em reunião com um corretor de seguros, tivemos novamente aquela epifania de constatação de plantão: estamos assistindo a um “repeteco” tecnológico de algo vivido há 30 anos durante o advento do computador pessoal. O corretor usava um notebook, equipado com (alguma versão do) Windows®, mas seu celular era equipado com Android (Linux, open source). Essa combinação está se repetindo em pelo menos 68% do tempo atualmente, segundo dados das principais consultorias de mercado e conforme divulgado durante a MOTODEV App Summit em maio deste ano.  O mais interessante, entretanto, é que, enquanto o celular (ainda) não é suficiente para substituir o PC, seu primo maior, o tablet, está ganhando cada vez mais adeptos. Embora com acesso limitado em grande maioria às classes A e B, seus usuários relatam estar cada vez menos propensos a ligar seus notebooks ou desktops. A mesma plataforma que equipa os celulares predominantemente nos dias de hoje está fadada a equipar os tablets.

O Android está se estabelecendo como plataforma padrão para esse tipo de desenvolvimento. A escolha realizada pelo Google – que não quer nada menos do que “aumentar a Internet”, com o objetivo de ganhar escala para o seu modelo de negócios baseado em propaganda sensível a contexto – de fornecer a tecnologia de base para os equipamentos que deverão estar nas mãos de mais de 70% da população do planeta, foi um primor estratégico! Além dos dados de busca, esses aparelhos servirão com certeza como coletores de dados dos hábitos de seus usuários, o que deverá aumentar a assertividade da propaganda veiculada pelo gigante das buscas. Do lado dos fabricantes de aparelhos (Samsung, Motorola, HTC, Sony-Ericsson, Huawei, para citar apenas alguns, pois há mais de 90 no momento), a plataforma caiu nas graças de quase todos. O fato de ser real e totalmente aberta conferiu aos fabricantes um poder nunca antes disponível, qual seja, o de operar em todos os níveis de desenvolvimento de seus sistemas gratuitamente. Para os fabricantes de software, há uma plataforma mais ou menos padronizada para desenvolvimento de programas, que está se consolidando e estabilizando com a chegada do Android 4.0.

Veremos praticamente toda uma nova gama de aplicativos aparecendo para a plataforma, da mesma forma que ocorreu com o PC há três décadas. A demanda por profissionais de desenvolvimento para dispositivos móveis está cada vez mais aquecida e os especialistas já disponíveis no mercado estão sendo disputados a tapa. A pilha de serviços em torno do Android está se consolidando e não tardarão a aparecer inclusive entidades que certifiquem a proficiência dos desenvolvedores na plataforma.

Para o usuário comum é apenas mais uma ferramenta, mas que democratiza o acesso à tecnologia pelo ganho de escala e pela quantidade de programadores que arregimenta. Como a base de tudo isso é o Software Livre, todas as vantagens oriundas das tecnologias abertas vêm de roldão: competição, inovação mais rápida, soluções mais flexíveis, controle de plataforma e independência de fornecedor, maior estabilidade e segurança, sem esquecer da formação local de mão-de-obra.

Parafraseando Linus Torvalds em sua palestra na LinuxCon Brasil 2011: isso
tudo vai estar até na pia da sua cozinha – pois já chegou à sua geladeira...



SILVA, Rafael Peregrino. Transição tecnológica. Revista Linux Magazine. n. 85, p.4. Dez/2011.

quarta-feira, novembro 30, 2011

Apelo a um Proscrito

"Ao partir, não tive qualquer sentimento de libertação. Não era empolgante ficar solteiro outra vez. Tanto eu como Claire tínhamos perdido." (GRISHAM, John. O Advogado. p.94)

Ele me disse que foi exatamente assim, sem despedidas, sem perspectivas, somente dor e solidão.

Foi assim que aquele homem saiu pela última vez do lugar que ele chamava de lar, ou melhor, ainda chama. "Lar é onde o nosso coração vive", confessou-me ele dizendo que, mesmo tendo saído, deixara essa parte importante pra trás, seu coração. Não sabia como viveria daí em diante, incompleto, sozinho, despedaçado, mutilado. Não conseguia pensar de forma racional e abstraída (algo que conseguia fazer muito bem em outros tempos), não conseguia ver soluções ou saídas, não via futuro, horizontes, não conseguia ver um palmo além da dor que o consumia, um palmo além das sombras. Talvez seus pensamentos estivessem nublados pelos incontáveis dias que passara sem comer ou dormir. Talvez fosse só a amplitude das desastrosas mudanças que o estavam acometendo. Talvez fosse a visão de sua colheita, "todos colhem o que plantam" é o que dizem, isso é um fato.

Ele me disse que, ao entrar em sua nova habitação, uma pequena casa com três pequenos cômodos, ligou todas as luzes, andou de um lado a outro, tocou nas paredes, olhou do teto ao chão e desabou em prantos, caído no chão, em meio à lágrimas e um grito cortante que foi ouvido por todos os vizinhos.

Enfim estava só. Ou melhor, não completamente só, estava com todos os seus demônios: culpa, arrependimento, medo e solidão. Esses eram os que o espreitavam mais de mais perto, tocando-lhe a face, rindo de suas volumosas lágrimas, chacoteando de sua posição fetal, passando os dedos pelos seus cabelos. Ele não tinha força alguma para afastá-los, ou talvez não quisesse afastá-los, era merecedor de tal castigo, carregaria pra sempre estes estigmas.

Apesar de estar com todas as luzes acessas, sentiu-se num umbral. As lembranças de seus erros caíam como pedras, cada vez maiores e mais dolorosas, enquanto ele, indefeso, tremia no chão frio. Virou-se e viu que haviam mais demônios, surgiam de todos os lados e aglomeravam-se ao seu redor, todos queriam tocá-lo, eles sentiram o cheiro de seus sentimentos e queriam alimentar-se disso. Fecharam-se tanto que ele não pôde mais respirar. A muito custo levantou-se, deu alguns passos vacilantes e caiu no rio Aqueronte, sentia sua consciência se esvair, sua vida fluir para a água gélida do rio, foi quando sentiu uma pesada mão puxar-lhe parta superfície, era Caronte, não sabia se o agradecia ou não, fechou os olhos e desmaiou. Acordou no Hades e, ao que parece, está lá desde então.

Não lembro de nenhum mero mortal que tenha descido os umbrais e adentrado à morada de Hades e tenha retornado inteiro, ninguém à exceção de deidades e semideidades. Sabe, conheço-o há algum tempo e espero, sinceramente, que ele volte de lá, mesmo sabendo que isso o transformará em outra pessoa completamente diferente, não sei até que ponto as nefastas influências desse lugar irão lhe afetar. Queria poder ajudá-lo, mas creio que ele já está além de qualquer ajuda humana, não consigo imaginar o quão dolorosas, excruciantes e ensandecedoras serão suas vinte e nove mortes. Mas como disse, mesmo sendo ele um mero mortal, espero voltar a vê-lo novamente e, mesmo que o encontre aqui pelo mundo superior e ele não me reconheça, dar-lhe-ei um largo sorriso.

Abraços amigo. Conte comigo.



quarta-feira, novembro 23, 2011

Legião Urbana - Vinte e Nove

Legião Urbana sempre fez parte da minha vida, foi a primeira banda com a qual eu realmente criei algum tipo de afetividade, isso lá nos meus 13 anos. Lembro-me que, quando comecei a trabalhar, aos 15, com meu primeiro ordenado, comprei o CD "O Descobrimento do Brasil", o qual consta a música que intitula este post: Vinte e Nove.

Com uma letra, como boa parte das letras do Renato, simples e de profundidade e sensibilidade abissais, figura entre as melhores músicas da banda. Os entusiastas e pseudo-historiadores de Legião Urbana sempre veem mais coisa do que as letras realmente mostram. No caso de "Vinte e Nove", o que eu vejo é uma trindade: queda, solidão e redenção.
Simples assim.

A meu ver, a letra é a narrativa de alguém que acaba por perder praticamente tudo que tem, tudo, não somente coisas materiais, tudo mesmo, amigos, família, filhos, dignidade, humanidade etc (vinte em vinte e nove amizades), e esse alguém é o único culpado pela própria queda (por conta de uma pedra em minhas mãos). E o pior: ele sabe disso.
É notório que pessoas que passam por quedas tão drásticas, acabam tendo os vícios como única solução e consolo, deixar-se cair mais e mais, mais fundo e mais rápido, isso não é uma solução, é autodestruição, mas poucos conseguem fugir disso quando se veem sozinhos (Me embriaguei morrendo vinte e nove vezes). Nesse ponto a solidão chega a ser palpável.
Perdi vinte em vinte e nove amizades
Por conta de uma pedra em minhas mãos
Me embriaguei morrendo vinte e nove vezes
Estou aprendendo a viver sem você
(Já que você não me quer mais)

A segunda parte da música trata dos esgotos e umbrais, dos conflitos e dificuldades, da luta diária contra a solidão (vinte e nove dias na prisão), de tudo que se passa até encontrar um novo norte, uma nova razão pra continuar (e aos vinte nove, com o retorno de Saturno, decidi começar a viver). Um fato interessante a se observar, o termo "retorno de Saturno" é tratado na astrologia como um ponto de inflexão na vida das pessoas, é o ponto onde se tomam grandes decisões e a vida dá uma virada completa, acontece entre os 28 e os 30 anos, é o ponto em que Saturno volta ao ponto onde estava no dia de seu nascimento.
Passei vinte e nove meses num navio
E vinte e nove dias na prisão
E aos vinte e nove, com o retorno de Saturno

A terceira e última parte trata do desprendimento do passado, para que se possa caminhar a um futuro, a  aceitação dos erros, as desculpa, os perdões, a redenção e o recomeço. É impossível caminhar adiante com o olhar virado pra trás, só quando ele se desprende dos erros cometidos, quando perdoa a si mesmo, é que se liberta e, como recompensa, coisas boas veem com naturalidade (vinte e nove anjos me saudaram e tive vinte e nove amigos outra vez).
Quando você deixou de me amar
Aprendi a perdoar
E a pedir perdão.
(E vinte e nove anjos me saudaram
E tive vinte e nove amigos outra vez)





quinta-feira, novembro 17, 2011

Vivaldi & Ferenc Cakó - As Quatro Estações & A Arte da Animação com Areia


Ontem, procurando algum "inspirador" pra ouvir enquanto escrevia alguns devaneios para este blog, recorri à minha afetada memória e lembrei de "As Quatro Estações / Le quattro stagioni", um inenarrável concerto para violino e orquestra de Vivaldi. Pois bem, de posse do meu alvo, fui pro Youtube e procurei algumas performances da obra, deparei-me com uma miniatura que continha uma ilustração que me chamou bastante atenção, era um tipo de desenho/animação, aparentemente, diferente de tudo que já tinha visto. Cliquei e fui assistir.

Acertei em cheio.

A animação era de autoria do húngaro Ferenc Cakó, especialista em animação com areia, algo que eu nunca, nunca, nunca mesmo, havia visto. A animação acompanha as sensações e impressões relacionadas à cada uma das quatro estações do concerto composto por Vivaldi e é, simplesmente, INCRÍVEL. A animação, de profundidade e sensibilidade incríveis, nos transporta a outros lugares e épocas, conhecidos ou não, presente e passado, faz-nos sentir um amálgama de sensações relacionadas ao clima, às estações, à configuração espacial dos lugares mostrados, às pessoas e seus sentimentos, às ações cotidianas em cada estação, e por aí vai.

Recomendo! Tanto pelo concerto de Vivaldi, quanto pela incrível animação de Cakó.


quarta-feira, novembro 16, 2011

Oração a Jum Sum - Haikai


***

E quando tentar dormir mostra-se excruciante,
adormecer, uma enganosa dádiva efêmera,
e despertar, uma fatal retomada aos pesadelos?

***

Jum Sum era a divindade chinesa do sono e, também, dos sonhos. Originou-se em algum momento do século I a.C., porém caindo quase totalmente no esquecimento.


Fonte: Jum Sum - Wikipédia. Disponível no link pt.wikipedia.org/wiki/Jum_Sum
Foto: "lonelyness", de Rafa Ohana, disponível no Flickr.

terça-feira, novembro 08, 2011

Lynn Hunt - A Invenção da Pornografia. Obscenidades e as origens da modernidade 1500 - 1800


A pornografia ainda provoca um intenso debate, mas, atualmente, no ocidente, está ao alcance de consumidores adultos e também de estudiosos. Ela não constituía uma categoria de literatura ou de representação visual independente e distinta antes do início do século XIX. Se a considerarmos como representação explícita de órgãos e práticas sexuais para estimular sensações, então, até meados ou final do século XVIII, a pornografia era sempre algo além. Na Europa, entre 1500 a 1800, era mais frequentemente um veículo que usava o sexo para chocar e criticar as autoridades políticas e religiosas. Porém, emergiu como vategoria distinta nos séculos entre o Renascimento e a Revolução Francesa, por causa, em parte, da difusão da própria cultura impressa, e seu desenvolvimento da pornografia ocorreu a partir dos avanços e retrocessos da atividade desordenada de escritores, pintores e gravadores, empenhados em por à prova os limites do decente e a censura da autoridade eclesiástica e secular.

Embora o desejo, a sensualidade, o erotismo e até mesmo a representação explícita de órgãos sexuais possam ser encontrados em muitos, senão em todos, tempos e lugares, a pornografia como categoria literal e artística parece ser um conceito tipicamente ocidental, com cronografia e geografia particulares. As principais fontes da tradição pornográfica podem ser encontradas na Itália do século XVI e na França e Inglaterra dos séculos XVII e XVIII, além do antecedentes da Grécia e Roma antigas.

Em 1806 já havia uma tradição pornográfica francesa, que sofria uma forte repressão policial, dirigida à obras pornográficas clássicas e também a tipos mais efêmeros, dentre os quais, encabeçando a lista, figuravam L'Académie des dames e L'École des filles, os principais clássicos do século XVII. Embora os livros franceses contituíssem o núcleo da tradição pornográfica dos séculos XVII e XVIII, a primeira fonte moderna citada pelos estudiosos da pornografia - e por muito de seus sucessores - é o escritor italiano Pietro Arentino, com a obra Ragionamenti (1534-1536), que tornou-se o modelo da porsa pornográfica do século XVII. Nela, o autor desenvolveu diálogos realistas e satíricos entre uma mulher mais velha e experiente e outra jovem e inocente. A composição em diálogos dominou completamente a literatura pornográfica e aparece, por exemplo, em La Philosophie dans le boudoir (1795), do Marquês de Sade.

Entre a publicação de L'Académie des dames e L'École des filles, e a grande reformulação dos escritores pornográficos ocorrida na década de 1740, a produção desse gênero ficou estagnada. As publicações, no entanto, continuaram, especialmente a da pornografia política. Entretanto, nenhuma obra importante surgiu para incorporar-se aos clássicos. A literatura pornográfica ganhou um novo alento com a publicação de obras novas e influentes: Histoire de Dom Bougre, portier des Chartreux (1741) e Le Sopha (1737) de Crébillon; Les Bijoux indiscrets (1748), de Diderot; Thérèse philosophe (1748) e Fanny Hill (1748), de Cleland; além das obras do Marquês de Sade.

Entre 1790 e 1830, dependendo do país - mais cedo na França, depois na Grã-Bretanha -, as funções social e política da pornografia mudam. A pornografia perde sua subversividade política e torna-se um negócio comercial. Sobre esse momento, Wagner escreve: "nada resta a ser dito sobre o aspecto ideológico [...], o prazer sexual é o único objetivo".




FONTE:
HUNT, Lynn (Org.). A Invenção da Pornografia: Obscenidades e as Origens da Modernidade. 1ª ed. São Paulo: Hedra, 1999.

Monostrófico da desesperancidade

De vate, nada me resta
que sirva de alento
da humanidade que já tive
apenas um epíteto
a outrora grande estirpe
quedou-se em mil fractais
a estimada confraria
apenas em lapsos memoriais
não há horizontes que me atraiam
risos que me distraiam
nem mesmo dores que me abstraiam
sem portos nos quais ancorar
resta a escolha: derivar ou naufragar?
ou seja, apenas a desesperança




sexta-feira, outubro 28, 2011

Marisa Monte - O que me importa (Tim Maia)

"O que me importa seu carinho agora, se é muito tarde para amar você..."
Eu nunca fui um ouvinte de Tim Maia, meu pai detestava ele e, até hoje, eu não sei o porquê... Eu não tenho essa aversão toda a ele, pelo contrário, até gosto! Mas, sinceramente, prefiro a Marisa Monte, ela é uma dessas mulheres que ficam ótimas até cantando "Parabéns pra você".

Certa vez um amigo me disse "essa é a música mais triste que eu já ouvi"... E é verdade...

A letra é pesada, tensa, e nem chega a ser um pedido de desculpas, é mais uma autoavaliação final, quando em frente ao irremediável, irreversível, incontestável... 


O que me importa
Seu carinho agora
Se é muito tarde
Para amar você...

O que me importa
Se você me adora
Se já não há razão
Prá lhe querer...

O que me importa
Ver você sofrer assim
Se quando eu lhe quis
Você nem mesmo soube dar
Amor!...

o que me importa
Ver você chorando
Se tantas vezes
Eu chorei também...

O que me importa
Sua voz chamando
Se prá você jamais
Eu fui alguém...

O que me importa
Essa tristeza em seu olhar
Se o meu olhar tem mais
Tristezas prá chorar
Que o seu!...

O que me importa
Ver você tão triste
Se triste fui
E você nem ligou...

O que me importa
Seu carinho agora
Se para mim
A vida terminou
Terminou! oh! oh! oh!
Terminou! oh! oh! oh!
Oh! oh! oh!...

quarta-feira, outubro 26, 2011

Rotineiricidades #3 - Gabriel García Marquéz & Cem anos de Solidão

" (...) porque as estirpes condenadas a cem anos de solidão não tinham uma segunda oportunidade sobre a terra."

O trecho acima é a última frase de "Cem anos de solidão" que é, de longe, a obra mais conhecida de García Márquez e uma das mais conhecidas da literatura mundial. Essa foi a obra pela qual fui apresentado a ele, e também o livro mais incrível que já li.

De forma lacônica e simplista, o livro conta os cem anos de história do povoado de Macondo, fundado por José Arcadio Buendía e Úrsula Iguarán, além de narrar as peripécias e desventuras vividas por eles e seus descendentes, do primeiro ao último, durante esses cem anos. Na minha parca opinião, é uma leitura mais que recomendada, é obrigatória!

Pois bem, hoje no caminho pro trabalho esse trecho não me saiu da cabeça e, juntamente com ele, me veio à cabeça a lembrança do pouco que li de Gabriel García Márquez. De imediato lembrei também do que me "disse" certa vez René Descartes, "a leitura de todos os bons livros é uma conversação com as pessoas dos séculos passados" (ou nem tão distantes assim) o que, de certa forma, é verdade. Todo escritor passa às suas obras características únicas que acabam por identificá-lo, são essas características que nos fazem ter mais ou menos afeição a determinados autores e, por conseguinte, criar uma forma diferenciada de amizade.

É dessa forma que me sinto quando leio García Marquez, sinto-me conversando com um grande amigo. E, dessa forma, passei os anos acumulando mais e mais amigos, Dostoiévski, Descartes, Nietzsche, Machado, Clarice, Rubem Alves, Veríssimo, dentre outros, ou melhor, dentre muitos outros, vários.

Texto integral, a quem interessar possa...

MARQUÉZ, Gabriel García. Cem Anos de Solidão. 48ª ed. Editora Record: Rio de Janeiro.

quinta-feira, outubro 20, 2011

Desafios matemáticos - A vida sem números (Superinteressante)

"Cálculos matemáticos existem desde a Pré-História. Mas podemos dizer que algarismos não. Quando eles chegaram ao Ocidente, jogaram a Europa em uma revolução que transformou o conhecimento"
Matéria muito boa da revista Superinteressante 296 (outubro / 2011), que conta um pouco da história das Matemáticas. Como a matéria completa é um pouco extensa demais e foge aos padrões do blog, resolvi postar apenas os desafios que pontuam a matéria. Ótimos para desenvolver habilidades lógico-matemáticas. Pois bem: Let's Math!

1. Multiplicação e adição


2. Adição e divisão


3. Adição e divisão

4. Multiplicação, subtração, adição e divisão

5. Fibonacci

Respostas aqui

Fonte:
A vida sem números - Superinteressante

quarta-feira, outubro 19, 2011

Legião Urbana - A Tempestade ou O Livro dos Dias


A Tempestade ou O Livro dos Dias, ou apenas A Tempestade, é o sétimo disco da banda brasileira de rock Legião Urbana, lançado em 20 de Setembro de 1996. É o último disco lançado pelo líder da banda, Renato Russo, ainda em vida. No Brasil foram vendidos mais de meio milhão de cópias e sendo premiado com Disco de Diamante pela ABPD.

Gravado entre janeiro e junho de 1996, no estúdio carioca AR Estúdios, foi planejado para ser um disco duplo, pois foram também gravadas canções que fariam parte do póstumo Uma Outra Estação, porém, a proposta foi novamente recusada, assim como o projeto "Mitologia e Intuição" (que originou os álbuns Dois e Que País É Este 1978/1987). Durante as gravações, Renato Russo não quis gravar vozes definitivas para todas as músicas, fazendo-o apenas na canção "A Via Láctea". Devido a isso, as outras canções contam com a voz-guia (primeira voz gravada para a música). Grande parte dos arranjos estava pronta desde o fim de 1995.

A maioria das letras do disco (escrita em 1996, durante os sintomas da doença de Renato) é considerada melancólica e triste, como se pode ver em canções como Mil Pedaços, Quando Você Voltar e Longe do Meu Lado, além de canções mais introspectivas, como O Livro dos Dias (que também é um dos nomes do disco) e Soul Parsifal (parceria inédita de Renato Russo com a cantora Marisa Monte). Há também espaço para letras mais cotidianas e alegres, como Leila, 1º de Julho (composta para Cássia Eller, que a gravou primeiramente) e Dezesseis (que fala sobre um jovem de Brasília, amante do rock, que falece aos 16 anos ao disputar um "racha" - corrida ilegal entre carros). A principal canção do disco foi A Via Láctea, com sua letra bastante depressiva.

As primeiras edições do disco vieram com uma capa especial em formatação de livro (no mesmo formato em que foi lançado Equilibrio Distante, segundo álbum solo de Renato Russo). Renato recusou-se a tirar fotos para o álbum, tendo sido usada uma foto tirada durante as sessões de fotos de "Equilibrio Distante". Mais tarde, ambos os discos foram relançados na caixa tradicional, de plástico. Em "A Tempestade", não constam agradecimentos e nem as tradicionais frases "Urbana Legio Omnia Vincit" (Legião Urbana a tudo vence) e "Ouça no volume máximo". Em seu lugar, foi escolhida uma frase do escritor modernista brasileiro Oswald de Andrade: "O Brasil é uma república federativa cheia de árvores e gente dizendo adeus".

Curiosidades
Segundo entrevista de Renato, o álbum foi lançado com dois nomes porque, enquanto ele preferia "A Tempestade", Bonfá preferia "O Livro dos Dias". Apesar dos dois nomes, apenas A Tempestade aparece na capa. Este nome também é uma referência a última peça deWilliam Shakespeare, denominada também A Tempestade.

A faixa "Dezesseis", além de citar Janis Joplin, Led Zeppelin, Rolling Stones e os Beatles, também cita uma música destes últimos:Strawberry Fields Forever. Além disso, suspeita-se que a canção seja uma homenagem à morte do piloto Ayrton Senna, em 1994 em um acidente durante uma corrida de Fórmula-1; Essas evidências aparecem em trechos sobre o opala metálico-azul (Williams azul que Senna corria quando se acidentou) e a Curva do Diabo (Alusão à curva Tamburello, local do acidente fatal);

A faixa "1º de Julho" fora feita por Russo para Cássia Eller, que a gravou no disco Cássia Eller, em 1994. Foi gravada durante as sessões de gravação de The Stonewall Celebration Concert, primeiro disco solo do cantor, em 1994.

Foi o primeiro álbum produzido pelo guitarrista Dado Villa-Lobos, embora o crédito também leve o nome da banda: "Produzido por Dado Villa-Lobos e Legião Urbana".
O cantor porto-riquenho Ricky Martin gravou uma versão em espanhol de "A Via Láctea", intitulada "Gracias por Pensar en Mi" ("obrigado por pensar em mim", trecho da canção original), em seu álbum MTV Unplugged, de 2007.


Faixas / Download
1. "Natália" 8– 3:55 | Download
2. "L'Avventura" – 4:37 | Download
3. "Música de Trabalho" – 4:19 | Download
4. "Longe do Meu Lado" (Renato Russo e Marcelo Bonfá) – 4:25 | Download
5. "A Via Láctea" – 4:39 | Download
6. "Música Ambiente" – 4:07 | Download
7. "Aloha" – 5:25 | Download
8. "Soul Parsifal" (Renato Russo/Marisa Monte) – 4:54 | Download
9. "Dezesseis" – 5:23 | Download
10. "Mil Pedaços" – 3:22 | Download
11. "Leila" – 5:22 | Download
12. "1º de Julho" (Renato Russo) – 4:49 | Download
13. "Esperando por Mim" – 4:21 | Download
14. "Quando Você Voltar" – 2:53 | Download
15. "O Livro dos Dias" – 4:18 | Download

Todas as canções, exceto onde houver indicação, tem a composição de Dado Villa-Lobos, Renato Russo e Marcelo Bonfá. Todas as letras são de Renato Russo


Fonte:
A Tempestade ou O Livro dos Dias - Wikipédia, a enciclopédia livre.

sexta-feira, outubro 14, 2011

Arnaldo Jabor - A idiotice é vital para a felicidade


Gente chata essa que quer ser séria, profunda e visceral sempre. Putz! A vida já é um caos, pq fazermos dela, ainda por cima, um tratado? Deixe a seriedade para as horas em que ela é inevitável: mortes, separações, dores e afins. No dia-a-dia, pelo amor de deus, seja idiota! Ria dos próprios defeitos. E de quem acha defeitos em vc. Ignore o que o boçal do seu chefe disse.

Pense assim: quem tem que carregar aquela cara feia, todos os dias, inseparavelmente é ele, pobre dele! Milhares de casamentos acabaram-se não pela falta de amor, dinheiro, sexo, sincronia, mas pela ausencia de idiotice. Trate seu amor como seu melhor amigo, e ponto. Quem disse que é bom dividirmos a vida com alguém que tem conselhos para tudo, soluções sensatas, mas não consegue rir quando tropeça?

Hahahaha. Alguem que sabe resolver uma crise familiar, mas não tem a menor idéia de como preencher as horas livres de um fim de semana? Qto tempo faz que vc não vai ao cinema? É bem comum gente que fica perdida quando se acabam os problemas. E dai, o que elas farão se já não têm pq se desesperar? Desaprenderam a brincar. Eu não quero alguém assim comigo. Vc quer? espero que não. Tudo o que é mais difícil é mais gostoso, mas... a realidade já é dura, piora se for densa. Dura, densa e bem ruim.

Brincar é legal. Entendeu? esqueça o que te falaram sobre ser adulto, tudo aquilo de não brincar com comida, não falar besteiras, não ser imaturo, não chorar, não andar descalço, não tomar chuva. Pule corda! Adultos podem (e devem) contar piadas, passear no parque, rir alto e lamber a tampa do iogurte. Ser adulto não é perder os prazeres da vida - e esse é o único "não" realmente aceitável. Teste a teoria. Uma semaninha, para começar. Veja e sinta as coisas como se elas fossem o que realmente são: passageiras.

Acorde de manhã e decida entre duas coisas: ficar de mau humor e transmitir isso adiante ou sorrir... Bom mesmo é ter problema na cabeça, sorriso na boca e paz no coração! Alias, entregue os problemas nas mãos de Deus e que tal um cafezinho gostoso agora? "a vida é uma peça de teatro que não permite ensaios" "por isso cante, chore, dance e viva intensamente antes que a cortina se feche".

Vi no blog da Aline Rodrigues e resolvi blogar também, muito bom... Creio que seja o que falta à maioria das pessoas, inclusive a mim: parar de levar a vida tão a sério.

terça-feira, outubro 11, 2011

segunda-feira, outubro 03, 2011

Gus Morais - Por uns bytes de memória...

Começo o post dando parabéns, mais que merecido, ao Gus Morais pela tirinha muito, Muito, MUITO BOA.

Não sei quantas pessoas leram ou lerão isto, aqui ou em outros blog, mas sei de uma coisa, muitos vão se identificar com o fim, uma parte com do meio pro fim e, muito poucos, do começo ao ao fim...

Nostalgia pura...

quarta-feira, setembro 28, 2011

Admirável Sonho Novo, Capítulo 2

Um sonho sobre infância, avós e telhados.


Minha família é toda oriunda de Salinópolis ou Salinas (como todos a chamam). Meus pais e eu nos mudamos pra Belém quando em '87 ou '88, não sei ao certo, e lembro que sempre passávamos as férias na barraca dos meus avós (pais da minha mãe), um casal muito gente fina: Seu Olímpio e Dona Ermita. Nenhum de nós, netos, os chamava por "vô" ou "vó" ou "vovô" ou "vovó"... Eles sempre foram paizinho e mãezinha, sempre, até o fim...

Na madrugada do último dia 25 de agosto eu tive um sonho e lembrei que há muitos anos eu não sonhava com eles, o que me deu um saudosismo sem nome da minha infância, foi como pegar um grande bolo de infância, dar uma bocada, perder 20 anos e voltar à Praia do Atalaia de minha meninice.

O sonho foi mais ou menos assim...

Estávamos construindo um telhado, meu pai e eu, de uma casa com dois andares, mais estreita do que comprida, com um pé-direito bem alto e um telhado com duas águas. O sonho começa enquanto pregávamos os caibros do telhado, ele na cumeeira e eu no frechal, enquanto minha avó, sentada à uma cadeira de balanço no lado oposto ao que trabalhávamos, conversava conosco. Meu pai e eu tínhamos a aparência atual enquanto que ela mantinha a aparência da minha infância.
(parêntesis)
Meu avô ficou cego antes de eu nascer, devido à catarata, entretanto, no sonho, minha avó que era cega e não ele...
(fim do parêntesis)

Era quase fim de tarde e minha mãe subiu por uma escada externa pra anunciar que o café estava pronto, descemos para a merenda e minha avó ficou lá em cima. Apesar de ser fim de tarde, logo que desci a escada, já era noite alta e percebi que esquecêramos D. Ermita lá em cima. Voltei e encontrei a cadeira de balanço vazia, minha avó estava nos andaimes, em meio às madeiras do telhado, tentando, sem chance, descer de lá. Ajudei-a a descer dos andaimes e a levei para baixo.

Quando chegamos ao térreo, já não era mais a minha avó e sim o meu avô, Seu Olímpio, que estava comigo. E isso, no sonho, foi a coisa mais natural do mundo, era como se ambos fossem um só e pudessem assumir qualquer uma das duas formas. Ele não estava cego, só um pouco cansado. Fomos até à mesa onde meus pais já estavam comendo: café (sem leite) e tapioca com manteiga.

Uma delícia.





Imagem "Telhado003" de Riceles Araújo Costa, extraída do blog Riceles Araújo: Arquitetura e Feng Shui

segunda-feira, setembro 26, 2011

Pearl Jam - Last Kiss

Na minha sequência de músicas neurantes e que demoram semanas, meses e até (como no caso de "Polaroid") anos pra sair da minha cabeça, encontro-me agora com Last Kiss, do Pearl Jam que é, de longe, a versão mais conhecida da música originalmente composta por Wayne Cochran, com uma letra que é tão bela quanto séria.

Wayne Cochran inspirou-se no acidente ocorrido no dia 22 de Dezembro de 1962, sábado, véspera de Natal, em Barnesville - Georgia. Os jovens: Jeanette Clark e L. Hancok, que era o motorista, ambos com 16 anos e mais outros três amigos, estavam em um Chevrolet 1954 em intenso tráfego quando atingiram um caminhão que carregava madeiras. Clark, Hancok e mais um amigo morreram; os outros dois ficaram seriamente feridos. Cochran dedicou a música à Jeanette Clark.




Oh where, oh where, can my baby be?
The Lord took her away from me.
She's gone to heaven so I've got to be good,
So I can see my baby when I leave this world.
We were out on a date in my daddy's car,
We hadn't driven very far.
There in the road straight ahead,
A car was stalled, the engine was dead.
I couldn't stop, so I swerved to the right,
I'll never forget the sound that night.
The screaming tires, the busting glass,
The painful scream that I heard last.
Oh where, oh where, can my baby be?
The Lord took her away from me.
She's gone to heaven so I've got to be good,
So I can see my baby when I leave this world.
When I woke up, the rain was pouring down,
There were people standing all around.
Something warm flowing through my eyes,
But somehow I found my baby that night.
I lifted her head, she looked at me and said;
"Hold me darling just a little while."
I held her close I kissed her - our last kiss,
I found the love that I knew I had missed.
Well now she's gone even though I hold her tight,
I lost my love, my life that night.
Oh where, oh where, can my baby be?
The Lord took her away from me.
She's gone to heaven so I've got to be good,
So I can see my baby when I leave this world.



Fonte:
Last Kiss - Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível no link Last Kiss.
Vídeo "Pearl Jam Last Kiss - Live Francisco 2006 - HD", incorporado do Youtube.
Letra da música extraída de Letras.mus.br

terça-feira, setembro 20, 2011

Material de apoio / Apostilas / Provas e Gabaritos - ENEM

Pois bem, na iminência de mais uma prova do nosso queridíssimo Exame Nacional do Ensino Médio, vulgo ENEM, resolvi procurar algum material pra usar como referência rápida pra eventuais leituras com o propósito de relembrar alguns tópicos que estão meio empoeirados. Acabei encontrando um material bem interessante da Secretaria de Educação do Paraná. Abaixo seguem os links para os arquivos no Issuu:



Espanhol  |  Inglês  |  Literatura |  Língua Portuguesa  |  Redação
Matemática  |  Física
Biologia  |  Química
Filosofia  |  Geografia  |  História

Lista de leitura obrigatórias (PS 2012 - UFPa)

Provas e gabaritos de 2005 a 2010: Canal Vestibular do Brasil Escola

quinta-feira, setembro 15, 2011

Lendas e mitos sobre o Embuá (ou Ambuá)


Ontem à noite ouvi a Toph gritar e perguntei o que houve, a mãe disse "Ela tem medo de 'ambuá', e passou um aqui perto dela...". Achei demais engraçado e acabei lembrando de uma estória que o Sr. Cirilo Borges e Silva, também conhecido como meu pai, contou-me há muitos anos, nos tempos em que eu era apenas um infante, ela era mais ou menos assim:
Certa vez, Deus e Diabo entraram em uma contenda que, por decisão de ambos, seria decidida em uma prova de velocidade, ambos teriam que criar um animal para uma corrida. Os dias passavam e o Diabo estava decidido a vencer, passava horas a fio modelando e projetando o seu veloz corredor, enquanto Deus nem sequer ligava e/ou lembrava disso. O Diabo, pensando que duas patas seriam insuficientes para construir um hábil corredor, resolveu inovar e fez um animal com 50 pares de patas: o Ambuá!

(Parentesis)
Sempre chamei o pequeno artrópode de Ambuá, mas descobri há pouco (agora mesmo, em verdade) que a grafia correta é Embuá.
(Fim do parentesis)


Pois bem, o diabo consegui finalizar o Ambuá quase na hora da corrida. Dirigiu-se ao local marcado para a contenda e logo Deus chegou, de mãos abanando, sem nada. Foi quando o Diabo o questionou "Onde está o teu representante para a corrida?".

Deus, vendo que não poderia fugir ao compromisso, olhou pra um lado, olhou pro outro, pra baixo e nada, de repente viu um cipó pendurado em uma árvore, puxou-o, deu um nó na ponta, soprou e jogou no chão: era uma Cobra!

A disputa correu e, mesmo com todo a preparação do Diabo, o Ambuá não teve a mínima chance contra a Cobra, que venceu com ampla vantagem!

***

Deixando o imaginário um pouco de lado, os Embuás são animais pertencentes à classe dos diplópodes (ou milípedes), filo dos átropodes, são animais herbívoros e detritívoros, são ovíparos e reproduzem-se de forma sexuada, possuem respiração traqueal e um corpo cilíndrico divido em cabeça (com um par de antenas e um par de olhos), tórax (menor parte) e abdomen segmentado (parte maior), possuem um par de patas por segmento, que podem variar entre 20 e 100 (acho que esses maiores foram criados pelo Diabo mesmo!). Quando ameaçados, enrodilham-se fingindo-se de mortos ou repelem substâncias defensivas, como o cianeto de hidrogênio, mas são inofensivos a humanos.


A única lenda/mito paraense que conheço relacionada a tal criatura é a que lhes foi relatada anteriormente. Entretanto, segundo os relatos de David Figueiredo, em algumas áreas do Amapá, os embuás são considerados venenosos, "consumidores" de sangue humano e dizem, inclusive, causar gravidez em mulheres que estão no período menstrual.



Fontes
Diplópode - Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível através do link.
FIGUEIREDO, Davis. Os Embuás no Imaginário Popular. Recanto das Letras, disponível através do link.

Imagens
1 - "Cylinroiulus caeruleocinctus", foto de Darkone, retirada da Wikimedia Commons.
2 - "Embuá", foto de ®$ñå£ð¤, retirada do Panoramio.

segunda-feira, setembro 12, 2011

Tão perto e tão longe


Tão perto e tão longe.

Aquele borrão azul chamou-lhe a atenção e o trouxe de volta, foi quando, de imediato, quedou-se-lhe aquela sensação de doce familiaridade e então ele a viu: tão perto e tão longe.

Ela não percebeu que ele a observava. Aproximadamente vinte impossíveis passos os separavam. Vinte passos entre dois ônibus emparelhados rodando a 80 por hora. Impossível estar tão perto e tão longe.

Observou-a com uma angústia crescente pelo fato de não poder falar-lhe, tocar-lhe, beijar-lhe. Sentiu-se impotente. Fraco. Só. E ela estava lá. Tão perto e tão longe.

De um lado, um rosto singelo, com uma expressão desatenta. Do outro, o desespero. Ele poderia gritar, esbravejar, mas ela não ouviria. Sem chance. Tão perto e tão longe.

A eternidade contida naqueles míseros quinze segundos acabou quando ele, triste e abatido, conseguiu trocar um olhar, ou melhor, não chegou a ser um olhar, uma fração, um relance, um quase olhar, um borrão de contato visual. Um suspiro. Um gesto. Um sorriso. O alívio. A alegria e a tristeza. Tudo instantaneamente. Estavam lá: tão perto e tão longe.

Tão perto e tão longe.

sexta-feira, setembro 09, 2011

E lá se vão 15 anos...

Engraçado.

Engraçado não, em verdade, é curioso.

Hoje consegui um lugar sentado no ônibus, mesmo morto de sono, fiz uma coisa que eu adoro fazer: olhar as pessoas na rua e tentar imaginar quem elas são, onde trabalham, o que pensam, do que gostam, e por aí vai. Algumas coisas são facilmente perceptíveis, outras não.

E, nesse meu passatempo diferente, ocasionalmente vejo pessoas conhecidas pela rua. Quase sempre. Pessoas que eu conheço de ver nas paradas de ônibus, pessoas que eu conheço de fato e, como no caso de hoje, pessoas que eu conheci.

Quando o ônibus passou um pouco do Panorama XXI, vi um rosto conhecido e pensei: "Égua! Esse cara tá velhão!", em referência à espessa barba que ele trazia num rosto ríspido e com um olhar sério. Acho que o nome dele é Carlos Alberto, primo de uma garota chamada Eneida, estudamos todos na mesma sala durante as três (ou quatro) últimas séries do antigo "1º grau", na escola Santana Marques.

De imediato lembrei de vários outros amigos dessa época: Martha, minha irmã mais velha, que hoje mora em Salinas; Roni, com quem eu jogava fliperama (e mais dois que eu não lembro o nome); Ábia e Eduardo, um casal bem "diferente" pra época; Renato, com quem, uma vez, eu tive uma briga na oitava série, fomos levados à diretoria, cinco dias de suspensão mas, no ano seguinte, viramos grandes amigos em outra escola, o Cordeiro de Farias; Rafael, que era louco por dinossauros e foi o responsável por me apresentar a esse "jurássico mundo novo"; Akira Goto, o cara com o menor nome que eu já conheci (esse era todo o nome dele); Johhan (ou Johann), uma mistura doida, nome alemão com sobrenome japonês (Tadayeski), e acho que tinha também um Tavares no final;  Reinaldo, da galera da bola, que morava numa casa que mais parecia um sítio; Marcela, que era muito perseguida por ser feia, coisa que eu não achava, só a achava pouco feminina; Gláucia, que levava almoço pra escola; Joyce e Joyce, uma loira e uma morena, as duas mais belas da sala; Jean, com quem eu tinha uma eterna disputa pra ver que conseguia tirar mais notas 10; esses e vários outros que eu não lembro o nome.

Pensando nisso, lembrei de quando todos nos despedimos, no fim da 8ª série, e eu lembrei que isso foi no fim de 96, eu tinha então 13 anos. Sou particularmente afeito a números e foi como se, de imediato,  algo estalasse na minha cabeça: 15 anos!

Foi há 15 anos.

Lembrei de novo do rosto do Carlos Alberto e disse pra mim mesmo: "Ele não tá velho, nós estamos velhos!". 15 anos é muito tempo. É mais da metade da minha vida. Passei o restante da viagem pensando no que eu fiz nesses 15 anos. Trabalhei. Trabalhei. Salinas. Herly. Icoaracy. Yoshi (Gustavo) Unama. Processamento de Dados. Não trabalhei. Prouni. Faci. Paratur. Toph (Manuela).

E cá estou. Fiz tanta coisa, ainda quero fazer tanta coisa e agora me pergunto: será que o que fiz valeu a pena? Lembro-me do que li de Nietzsche: "Aquilo que se faz por amor está sempre além do bem e do mal". Será que eu fiz tudo realmente com esse intuito? Será que fiz certo? Será que fiz errado? Será que fiz tudo com a tal "vontade de poder"? Será? E se? E se? E se...

Vale a pena refletir.

Acho que nunca saberei realmente... É como aquela propaganda do canal Futura: "Não são as respostas que movem o mundo. São as perguntas!"

segunda-feira, setembro 05, 2011

Um dia a maioria de nós irá se separar...

A todos os meus poucos amigos, dedico tais palavras...


"Um dia a maioria de nós irá se separar. Sentiremos saudades de todas as conversas jogadas fora, as descobertas que fizemos, dos sonhos que tivemos, dos tantos risos e momentos que compartilhamos...

Saudades até dos momentos de lágrima, da angústia, das vésperas de finais de semana, de finais de ano, enfim... do companheirismo vivido... Sempre pensei que as amizades continuassem para sempre...

Hoje não tenho mais tanta certeza disso. Em breve cada um vai pra seu lado, seja pelo destino, ou por algum desentendimento, segue a sua vida, talvez continuemos a nos encontrar, quem sabe... nos e-mails trocados...

Podemos nos telefonar... conversar algumas bobagens. Aí os dias vão passar... meses... anos... até este contato tornar-se cada vez mais raro. Vamos nos perder no tempo...

Um dia nossos filhos verão aquelas fotografias e perguntarão: Quem são aquelas pessoas? Diremos que eram nossos amigos. E... isso vai doer tanto!!! Foram meus amigos, foi com eles que vivi os melhores anos de minha vida!

A saudade vai apertar bem dentro do peito. Vai dar uma vontade de ligar, ouvir aquelas vozes novamente... Quando o nosso grupo estiver incompleto... nos reuniremos para um último adeus de um amigo. E entre lágrima nos abraçaremos...

Faremos promessas de nos encontrar mais vezes daquele dia em diante. Por fim, cada um vai para o seu lado para continuar a viver a sua vidinha isolada do passado... E nos perderemos no tempo...

Por isso, fica aqui um pedido deste humilde amigo: não deixes que a vida passe em branco, e que pequenas adversidades sejam a causa de grandes tempestades...

Eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores... mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos!!!"
Vinícius de Moraes





Foto: Guilherme Costa. Trapiche da praia do Laranjal em Pelotas/RS. Disponível no Flickr.

quarta-feira, agosto 31, 2011

Flor de Tófus


Um dia tive um sonho e só o que sobrou foi a imagem dessa flor... acho que era um sábado, levantei, peguei papel e caneta e desenhei. Fui no banheiro e quando voltei a Manuela tinha rasgado o papel, essa péssima!


PS: Acho que clicando na imagem ela fica maior...

[Toph] Manuela - Haikai


***

Mas como é que uma coisa assim
Me chega sem prévio aviso
E me arrebata pra longe de mim

***

Haikai em homenagem à pequena grande noor dos meus olhos, Toph Manuela, que, há dois anos, tem tornado a minha vida mais apaixonante. 31 de agosto. Parabéns filha. Amo-te além da mera compreensão e verbalização.

quinta-feira, agosto 25, 2011

Rotineiricidades #2


Quarta-feira. 20:22.

Noite quente, uma constante em Belém, aqui, até mesmo quando chove o clima é quente... e úmido, clima característico da região Amazônica, há quem reclame, há quem goste, há quem se acostume.

Pois bem, era quarta-feira e, como de costume, ele deveria estar em algum bar matando aula ou trabalhando no jornal, nos últimos meses a probabilidade de uma ou outra coisa era praticamente a mesma. Entretanto, justamente nesse dia, ele estava com a cabeça atribulada por pensamentos, muitos, tentava analisar todos os pontos de vista de cada um de seus inúmeros problemas, as possibilidades de resolução, as novas oportunidades que estavam surgindo, tentava avaliar cada pequeno passo que daria e, claro, suas consequências. Com tanta coisa pra pensar, o lógico (pra ele) seria ir andando até sua casa, um trajeto de pouco mais de 10 km, entretanto, cansado como estava, resolvera ir de ônibus mesmo.

Pegou o primeiro que apareceu, o 663, Bengui - F.Patroni, não estava lotado, mas também não estava vazio, todos os assentos estavam ocupados e duas ou três pessoas estavam em pé. Como disse, a noite estava muito quente e rapidamente ele começou a suar, entretanto, de tão íntimo com seus próprios pensamentos, não se deu conta de tal fato. Não percebeu até passar pelo longo (e rápido) trecho da avenida Almirante Barroso que separa as avenidas Júlio César e Tavares Bastos. Com a velocidade que o ônibus alcançou, das janelas abertas, um forte vento inundou todo o ônibus, sacudindo-lhe os pensamentos e trazendo-o de volta ao mundo real.

De súbito estranhou, mas logo sua percepção retornou e ele percebeu onde estava. Ignorava totalmente que ônibus estava e como (ou quando) havia adentrado no mesmo. Olhou atentamente cada uma das pessoas ao redor, todas sérias, compenetradas, imersas em seus próprios pensamentos ou contemplando a rua que passava pelas janelas, cada uma delas mais diferente e particular que a outra. Só uma coisa era constante e absoluta: o silêncio.

Não obstante ao barulho dos carros, as buzinas e a falácia que fluía das ruas, dentro do ônibus reinava o mais absoluto silêncio, ninguém falava com ninguém, todos estavam como que olhando para dentro de si próprios, muito ocupados consigo mesmos, e esse silêncio, esse estado de quase meditação coletiva, arrebatou-o, maravilhou-o. Rubem Alves disse que "Deus é isto: a beleza que se ouve no silêncio". Apesar de admirador de tal autor, ele era ateu mas, mas concordava plenamente com a beleza traduzida ao ouvir-se o silêncio, só não compreendia tal atribuição à uma deidade.

Nesse momento tentou imaginar o que cada um deveria estar pensando, milhares de possibilidades abriram-se-lhe e sua mente viajou a cada um dos universos próprios criados por nós mesmos para que possamos desenvolver nossas ideias e pensamentos. Olhou novamente cada um dos passageiros, ninguém chamava sua atenção, pelo menos não sozinho, o que chamava atenção era o comportamento coletivo, o silêncio de todos. Nesse ponto ele lembrou-se de uma das meditações de Descartes (a terceira, pra ser mais exato) que diz:
"Fecharei os olhos, tamparei os ouvidos, afastar-me-ei de todos os sentidos, apagarei do meu pensamento todas as imagens de coisas corporais, ou, ao menos já que é muito difícil fazê-lo, considerá-las-ei insignificantes e enganosas; e, desta maneira, ocupando-me somente comigo mesmo e considerando meu interior, procurarei tornar-me pouco a pouco mais conhecido e mais familiar a mim mesmo [...]"
Continuou assim até chegar à sua parada. 20:58. Fez sinal. Desceu. Foi pra casa...





Referências:
ALVES, Rubem. Escutatório. Disponível em A Casa de Rubem Alves
DESCARTES, René. Discurso do Método (Os Pensadores). São Paulo: Editora Nova Cultural, 1999 [original de 1637].
Imagem retirada (e editada) do tópico Sozinho na Multidão do blog Geléia de Insanidade.

Julieta Venegas & Marisa Monte - Ilusión (Acústico/Unplugged MTV)


Essa mexicana, Julieta Venegas, foi-me apresentada há um tempo pelo meu caríssimo amigo Lino Ribeiro da Ponte Jr, vulgo @LacunaCerebral, em uma conversa no msn quando, o mesmo, perguntou-me se eu conseguiria achar um link decente pra baixar o Acústico MTV da cantora anteriormente citada. Googuei, encontrei, baixei. Uma mulher linda, com uma voz linda, com músicas lindas! Impossível não gostar.

Mas, de todas as faixas, sem sombra alguma de dúvida, a que mais chama a atenção é um dueto fantástico com una cantante brasileña, que é, nada mais, nada menos, que Marisa Monte. São duas belas vozes que dispensam qualquer tipo de comentário, só ouvindo mesmo!



Link pra download do Unplugged MTV

terça-feira, agosto 23, 2011

Viniciu de Moraes - Soneto de Fidelidade

Agora há pouco, em meio a devaneios, peguei-me relembrando desse soneto e, lembrando particularmente, dos dois últimos versos...
















                        ***

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

                        ***
MORAES, Vinicius de. Antologia Poética. Rio de Janeiro: 1960. Pág. 96.

sexta-feira, agosto 19, 2011

Insana veisalgia insone: um conto sobre o Andejo e Parténope


Ele bebera bastante na véspera. Churrasco de domingo com amigos: futebol, videogame, muita carne e muita cerveja. Até aí tudo dentro da normalidade.

O dia seguinte foi terrível (como todas as segundas-feiras costumam ser), a ressaca era indescritível, a dor de cabeça característica estava particularmente forte, além de uma falta de apetite e enjoos atípicos. Trabalhou o dia todo no modo "piloto automático", fazendo tudo mecanicamente e comunicando-se por monossílabos e/ou gestos. Foi uma manhã longa. Aos atropelos chegou o fim do expediente e, como estava deveras afetado por todos esses malefícios, resolveu não almoçar, sabia que qualquer coisa que ingerisse seria violentamente repelida e isso, fatalmente, faria mais mal do que bem a ele.

A tarde deve ter sido complicada, por assim dizer, amnésia, ele não lembrava de nada desde que saíra do trabalho.

Quando tornou a si era noite, estava vagando, andara a esmo por algumas horas em ruas que nem ao menos sabia o nome. Mas, não obstante a isso, sentia-se bem, sentia que não estava sozinho, tinha plena certeza da companhia de uma mulher, uma linda mulher que constantemente lhe sussurava ao ouvido, cantarolando coisas sem nexo, fatos, mitos, lugares, direções, saídas, soluções, cantarolando como uma sirena às avessas, mostrando-lhe a luz ao invés das trevas, guardando-o das pedras no caminho. Como disse, andaram durante muito tempo e durante horas e horas ela lhe cantou muitas histórias, algumas com finais felizes, outras não, lendas e mais lendas, fatos há muito ocorridos e fatos que talvez ainda estivessem por acontecer. Assim seguiram a noite.

Ela, Parténope, estava sempre à sua destra. Ele, Andejo, sempre extasiado. Calado. Absorto. Inebriado por aquela beleza não visível, impalpável, perceptível apenas por sentidos não físicos, por assim dizer, dotada de uma sensualidade (e sexualidade) que o envolvia por completo, que o levava a mundos distantes, os mesmos mundos das histórias recém cantadas, despertando desejos e sensações que ele nem ao menos sabia que existiam. E, não mais que de repente, o silêncio. Ao término desses cânticos, de súbito, veio-lhe à mente o que Kafka dissera sobre as sirenas:
"As sereias, porém, possuem uma arma ainda mais terrível do que seu canto: seu silêncio"
Silêncio.

E foi como se despertasse de um sonho, Parténope desaparecera, se fora, ele estava sozinho em pé diante da porta de casa. O mal estar desaparecera quase que por completo, o último infortúnio que ainda o acompanhava era o sono. Entrou... Tomou banho... Deitou-se... Tentou dormir... Dormiu... Enganou-se, em verdade, apenas imaginou que dormia, em dado momento percebeu, que estava acordado, com os olhos abertos e ardendo, devido ao tempo que os manteve desse modo, sem perceber. Aí, segundo consta, começou a pior parte desse dia: a insônia, a causadora de tudo que estaria por vir.

Logo ao perceber que estava acordado surgiu o incômodo de estar na mesma posição há bastante tempo, mudou de posição, deitou-se de bruços, cinco minutos, deitou-se de costas, mais cinco minutos, de lado, mais cinco minutos e assim foi. A noite continua impassível e um leve desconforto muscular sentido no decorrer do dia piorou com a repentina febre. A febre aumentou bastante, foi quando os delírios começaram.

No início eram apenas passos no corredor que morriam na cozinha (e vice-versa), copos e talheres que se chocavam e até a porta da geladeira batendo. Isso acabou com qualquer possibilidade/tentativa de dormir. Os delírios aumentavam proporcionalmente à febre, logo estava ouvindo pessoas conversando e  o chamando pelo nome, estava tudo ficando muito mais real. Alguém girou a chave na porta da frente e entrou, passou pelo corredor, parou em frente à porta entreaberta do quarto, olhou e continuou até a cozinha. "Isso já é demais!", pensou ele. Levantou-se mas, tiritando como estava, não conseguiu manter-se totalmente ereto ao caminhar, andava de cabeça baixa, fitando o chão, conseguiu chegar a cozinha e ver alguém junto à porta dos fundos. A interlocutora (ele percebera que era uma mulher) gritava coisas ininteligíveis e, agressiva, atacou-o. Ele ainda estava de cabeça baixa e só podia ver até os joelhos da mulher. Dando dois passos para trás, ele conseguiu segurar-se à uma cadeira, que foi agarrada e levantada em uma investida ao rosto de quem o atacava. Nesse ponto conseguiu levantar-se e ver o rosto de sua mãe. De imediato, percebeu que, na verdade, estava levantando o rosto do colchão: ainda estava deitado na cama.

Seguiram-se brigas e discussões acirradas, quedas de objetos, mas ele não se levantou mais. Começava a sentir o corpo de outra maneira, meio abstrata, meio sinestésica, misturando os sentidos em orgias de muitos corpos que, no fim, eram apenas um: o seu próprio. Coisas desse tipo continuaram no decorrer de toda a madrugada até que, para seu alívio, a alvorada chegou. Foi como se tivesse sido libertado de correntes imaginárias trazidas pela escuridão e pelo medo. Agora estava livre. Um banho frio aliviou a febre, as dores no corpo amenizaram também. Vestiu-se. Saiu rumo ao trabalho. Sentiu um afago e um sussurro junto ao ouvido: Parténope voltara.

Abraçou-a longamente, deu-lhe um longo beijo e pensou: "estou salvo".

Ledo engano, era apenas o começo...






Foto: "wet hair", de pequeña esquimal, disponível no Flickr.

sexta-feira, agosto 12, 2011

Rubem Alves - Escutatório

Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir. Pensei em oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém vai se matricular.

Escutar é complicado e sutil. Diz o Alberto Caeiro que “não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. É preciso também não ter filosofia nenhuma“. Filosofia é um monte de ideias, dentro da cabeça, sobre como são as coisas. Aí a gente que não é cego abre os olhos. Diante de nós, fora da cabeça, nos campos e matas, estão as árvores e as flores. Ver é colocar dentro da cabeça aquilo que existe fora. O cego não vê porque as janelas dele estão fechadas. O que está fora não consegue entrar. A gente não é cego. As árvores e as flores entram. Mas - coitadinhas delas - entram e caem num mar de ideias. São misturadas nas palavras da filosofia que mora em nós. Perdem a sua simplicidade de existir. Ficam outras coisas. Então, o que vemos não são as árvores e as flores. Para se ver e preciso que a cabeça esteja vazia. 

Faz muito tempo, nunca me esqueci. Eu ia de ônibus. Atrás, duas mulheres conversavam. Uma delas contava para a amiga os seus sofrimentos. (Contou-me uma amiga, nordestina, que o jogo que as mulheres do Nordeste gostam de fazer quando conversam umas com as outras é comparar sofrimentos. Quanto maior o sofrimento, mais bonitas são a mulher e a sua vida. Conversar é a arte de produzir-se literariamente como mulher de sofrimentos. Acho que foi lá que a ópera foi inventada. A alma é uma literatura. É nisso que se baseia a psicanálise...) Voltando ao ônibus. Falavam de sofrimentos. Uma delas contava do marido hospitalizado, dos médicos, dos exames complicados, das injeções na veia - a enfermeira nunca acertava -, dos vômitos e das urinas. Era um relato comovente de dor. Até que o relato chegou ao fim, esperando, evidentemente, o aplauso, a admiração, uma palavra de acolhimento na alma da outra que, supostamente, ouvia. Mas o que a sofredora ouviu foi o seguinte: “Mas isso não é nada...“ A segunda iniciou, então, uma história de sofrimentos incomparavelmente mais terríveis e dignos de uma ópera que os sofrimentos da primeira.

Parafraseio o Alberto Caeiro: “Não é bastante ter ouvidos para se ouvir o que é dito. É preciso também que haja silêncio dentro da alma.“ Daí a dificuldade: a gente não aguenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor, sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer. Como se aquilo que ele diz não fosse digno de descansada consideração e precisasse ser complementado por aquilo que a gente tem a dizer, que é muito melhor. No fundo somos todos iguais às duas mulheres do ônibus. Certo estava Lichtenberg - citado por Murilo Mendes: “Há quem não ouça até que lhe cortem as orelhas.“ Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil da nossa arrogância e vaidade: no fundo, somos os mais bonitos...

Tenho um velho amigo, Jovelino, que se mudou para os Estados Unidos, estimulado pela revolução de 64. Pastor protestante (não “evangélico“), foi trabalhar num programa educacional da Igreja Presbiteriana USA, voltado para minorias. Contou-me de sua experiência com os índios. As reuniões são estranhas. Reunidos os participantes, ninguém fala. Há um longo, longo silêncio. (Os pianistas, antes de iniciar o concerto, diante do piano, ficam assentados em silêncio, como se estivessem orando. Não rezando. Reza é falatório para não ouvir. Orando. Abrindo vazios de silêncio. Expulsando todas as ideias estranhas. Também para se tocar piano é preciso não ter filosofia nenhuma). Todos em silêncio, à espera do pensamento essencial. Aí, de repente, alguém fala. Curto. Todos ouvem. Terminada a fala, novo silêncio. Falar logo em seguida seria um grande desrespeito. Pois o outro falou os seus pensamentos, pensamentos que julgava essenciais. Sendo dele, os pensamentos não são meus. São-me estranhos. Comida que é preciso digerir. Digerir leva tempo. É preciso tempo para entender o que o outro falou. Se falo logo a seguir são duas as possibilidades. Primeira: “Fiquei em silêncio só por delicadeza. Na verdade, não ouvi o que você falou. Enquanto você falava eu pensava nas coisas que eu iria falar quando você terminasse sua (tola) fala. Falo como se você não tivesse falado.“ Segunda: “Ouvi o que você falou. Mas isso que você falou como novidade eu já pensei há muito tempo. É coisa velha para mim. Tanto que nem preciso pensar sobre o que você falou.“ Em ambos os casos estou chamando o outro de tolo. O que é pior que uma bofetada. O longo silêncio quer dizer: “Estou ponderando cuidadosamente tudo aquilo que você falou.“ E assim vai a reunião.

Há grupos religiosos cuja liturgia consiste de silêncio. Faz alguns anos passei uma semana num mosteiro na Suíça, Grand Champs. Eu e algumas outras pessoas ali estávamos para, juntos, escrever um livro. Era uma antiga fazenda. Velhas construções, não me esqueço da água no chafariz onde as pombas vinham beber. Havia uma disciplina de silêncio, não total, mas de uma fala mínima. O que me deu enorme prazer às refeições. Não tinha a obrigação de manter uma conversa com meus vizinhos de mesa. Podia comer pensando na comida. Também para comer é preciso não ter filosofia. Não ter obrigação de falar é uma felicidade. Mas logo fui informado de que parte da disciplina do mosteiro era participar da liturgia três vezes por dia: às 7 da manhã, ao meio-dia e às 6 da tarde. Estremeci de medo. Mas obedeci. O lugar sagrado era um velho celeiro, todo de madeira, teto muito alto. Escuro. Haviam aberto buracos na madeira, ali colocando vidros de várias cores. Era uma atmosfera de luz mortiça, iluminado por algumas velas sobre o altar, uma mesa simples com um ícone oriental de Cristo. Uns poucos bancos arranjados em “U“ definiam um amplo espaço vazio, no centro, onde quem quisesse podia se assentar numa almofada, sobre um tapete. Cheguei alguns minutos antes da hora marcada. Era um grande silêncio. Muito frio, nuvens escuras cobriam o céu e corriam, levadas por um vento impetuoso que descia dos Alpes. A força do vento era tanta que o velho celeiro torcia e rangia, como se fosse um navio de madeira num mar agitado. O vento batia nas macieiras nuas do pomar e o barulho era como o de ondas que se quebram. Estranhei. Os suíços são sempre pontuais. A liturgia não começava. E ninguém tomava providências. Todos continuavam do mesmo jeito, sem nada fazer. Ninguém que se levantasse para dizer: “Meus irmãos, vamos cantar o hino...“ Cinco minutos, dez, quinze. Só depois de vinte minutos é que eu, estúpido, percebi que tudo já se iniciara vinte minutos antes. As pessoas estavam lá para se alimentar de silêncio. E eu comecei a me alimentar de silêncio também. Não basta o silêncio de fora. É preciso silêncio dentro. Ausência de pensamentos. E aí, quando se faz o silêncio dentro, a gente começa a ouvir coisas que não ouvia. Eu comecei a ouvir. Fernando Pessoa conhecia a experiência, e se referia a algo que se ouve nos interstícios das palavras, no lugar onde não há palavras. E música, melodia que não havia e que quando ouvida nos faz chorar. A música acontece no silêncio. É preciso que todos os ruídos cessem. No silêncio, abrem-se as portas de um mundo encantado que mora em nós - como no poema de Mallarmé, A catedral submersa, que Debussy musicou. A alma é uma catedral submersa. No fundo do mar - quem faz mergulho sabe - a boca fica fechada. Somos todos olhos e ouvidos. Me veio agora a ideia de que, talvez, essa seja a essência da experiência religiosa - quando ficamos mudos, sem fala. Aí, livres dos ruídos do falatório e dos saberes da filosofia, ouvimos a melodia que não havia, que de tão linda nos faz chorar. Para mim Deus é isto: a beleza que se ouve no silêncio. Daí a importância de saber ouvir os outros: a beleza mora lá também. Comunhão é quando a beleza do outro e a beleza da gente se juntam num contraponto... (O amor que acende a lua, pág. 65.)


FONTE
ALVES, Rubem. Escutatória. Disponível em: A Casa de Rubem Alves

segunda-feira, agosto 08, 2011

Folhas Secas

Tenho o hábito de caminhar bastante (quando tenho tempo) e, o ato de caminhar, por ser a atividade física à qual o ser humano está mais bem preparado, é um ótimo exercício, tanto físico, quanto mental, além de ser, claro, uma das principais características que nos diferencia dos demais primatas. Mas, deixemos tais considerações de lado. Como disse, tenho o hábito de caminhar, principalmente quando preciso pensar e, ultimamente, tenho feito muito o trajeto entre minhas duas ocupações, Reduto - Marco, algo em torno de 5,5km.

Certa vez me aconteceu um fato inusitado, que sempre me volta à mente quando passo em frente ao que, um dia fora uma lanchonete Bob's (atualmente em reforma), na Av. Gov. José Malcher entre Generalíssimo Deodoro e Dom Romualdo de Seixas (eu acho).

Pois bem, um certo dia, entre 14:30 e 15:00, estava eu a cruzar a José Malcher totalmente absorto em considerações, ponderações e devaneios quando, súbita e repentinamente, cruzei o acima referido trecho. Seria um trecho normal, se a calçada não estivesse completamente coberta de folhas secas de mangueira. Aquilo foi suficiente pra me transportar de um transe e me por em outro: quando dei o primeiro passo nas folhas secas e ouvi o farfalhar, fiquei admirado e absorto com aquilo, o farfalhar, meus pés inundados levantando folhas e mais folhas, e o farfalhar, algumas folhar voltavam empurradas pelo vento, e ainda havia o farfalhar, outras folhas se prendiam pelos sapatos, e ouvia-se, ainda, o farfalhar, já não conseguia pensar em mais nada, só no farfalhar. Creio que levei o tempo de 32 passos para atravessar tal trecho, um tempo curto, mas que ficou eternizado na minha memória e vai durar o tempo dos tempos pelos quais eu passar por aquele lugar.


Com preguiça de fotografar, peguei uma foto do...
Foto: Adib Valentim. Blog Momentos Fotografados.

segunda-feira, julho 04, 2011

O Paradoxo dos Aniversários

Outro dia em um divertido almoço ao lado com o estatístico Admilson Alcantara, sobreveio-nos algumas ponderações estatístico-filosófico-matemáticas acerca do Paradoxo (ou problema) dos Aniversários.

Enunciado do paradoxo
Imaginem que num certo momento estão com um grupo de pessoas, por exemplo, numa reunião familiar ou num bar, qualquer grupo aleatório de pessoas dará. Digamos que há 25 pessoas. Coloco-vos a seguinte questão: Qual pensam que é a probabilidade de que nesse grupo de pessoas haja duas pessoas que façam anos no mesmo dia do mesmo mês?

Quem não conheça este assunto provavelmente responderá: Não sei, mas deve ser muito pequena. Pelo menos essa é basicamente a resposta que encontrei sempre que comentei este assunto.

Mas, a verdade é que não é nada pequena. Vejamos como poderíamos considerar o enunciado do paradoxo:

Numa reunião de 23 pessoas escolhidas aleatoriamente, a probabilidade de que duas delas façam anos no mesmo dia do mesmo mês é de 0,507 ou seja, há 50,7% de possibilidades de que haja duas pessoas que façam anos no mesmo dia do mesmo mês.

Para as 25 pessoas do meu exemplo a probabilidade é de aproximadamente de 0,57, ou seja, quase 57%.

Basicamente o que nos diz este resultado é que numa reunião de 23 ou mais pessoas, é mais surpreendente que não haja duas que coincidam no aniversário do que haja pessoas cujo aniversário não seja coincidente, algo que todos nós tendemos a não acreditar num primeiro momento.

Demonstração matemática
O resultado não é um paradoxo matemático, é algo comprovável (e até facilmente) matematicamente. A designação de paradoxo advém do facto de parecer contradizer a intuição.

Para calcular a probabilidade para qualquer número de pessoas n menor ou igual a 365 (já que se há mais de 365 pessoas a probabilidade é 1) a ideia é calcular a probabilidade de que não haja duas pessoas que façam anos no mesmo dia. A esta probabilidade chamaremos P. Depois calculamos a probabilidade de que haja algum par de pessoas façam anos no mesmo dia, efectuando a operação 1 - P. Calculemos P (tomaremos o ano com 365 dias):

Tomemos uma das pessoas do grupo. Essa pessoa fará anos num certo dia. Tomemos outra das pessoas. A probabilidade de que o aniversário desta nova pessoa não coincida com o aniversário da primeira é 364/365 (casos favoráveis: todos os dias do ano excepto o do aniversário da primeira pessoa; casos possíveis: todos os dias do ano). Se tomamos uma outra pessoa mais, a probabilidade de que não coincida com nenhuma das anteriores é 363/365 (pela mesma razão). Tomando outra mais, a probabilidade de que não coincida com nenhuma das anteriores é 362/365, e assim sucessivamente. A probabilidade de que ocorram todos estes acontecimentos (que ninguém coincida) é o produto de todas estas probabilidades. Para n pessoas ficamos com a seguinte expressão:

P = (364/365).(363/365).(362/365)….(365 – n +1)/365

Usando factoriais podemos escrever esta expressão assim:

P = 365!/[365^n.(365 - n)!]

Se esta é a probabilidade de que não haja duas pessoas que coincidam no aniversário, a probabilidade de que haja pelo menos um par de pessoas que coincida será 1 - P. Ou seja, a probabilidade de que numa reunião de n pessoas haja duas que façam anos no mesmo dia e mesmo mês é:

P =1 - 365!/[365^n.(365 - n)!]

Com n = 22 obtemos uma probabilidade de 0,475695. Com n = 23 já passamos a 50%, com rigor uma probabilidade de 0,507297. Com n = 25, como no exemplo inicial, estamos já com 0,5687.

Aqui ficam mais alguns resultados:
Para n = 30, a probabilidade é de 0,706316, pouco mais de 70%.
Para n = 35, a probabilidade é de 0,8143383, pouco mais de 81%.
Para n = 40, a probabilidade é de 0,891232, quase de 90%.
Para n = 45, a probabilidade é de 0,940976, cerca de 95%.
Para n = 50, a probabilidade é de 0,970374, mais de 97%.
Para n = 60, a probabilidade é de 0,994123, mais de 99%!!.

A questão é que geralmente cada pessoa tende a imaginar a probabilidade de que, partindo de uma pessoa concreta, haja outra que coincida no aniversário com ela. A probabilidade de isso acontecer é de facto muito baixa em 23 pessoas. A chave do problema é que há uma multiplicidade de pares possíveis que podem formar-se e que vão aumentando conforme aumenta o número de pessoas do grupo. Por isso é que a probabilidade acaba por ser tão alta num grupo tão pequeno.

FONTE:
Matmagias: O paradoxo do aniversário. Disponível em: Matmagias
Gráfico proveniente de Wikipédia