Agnicaitanya era o líder de uma grande alcateia, era o lobo mais inteligente e esperto de todos os lobos. Viviam em uma tranquila planície às margens de uma densa floresta ao sul das Terras Geladas.
Tudo corria bem, até a chegada de uma outra alcateia, em verdade, do que sobrou de uma outra alcateia: eram três sobreviventes, dois machos e uma fêmea. Oriundos do norte, desceram para as planícies quando foram atacados e quase totalmente dizimados por um ente que veio a ser chamado apenas de "Adversário". Estavam feridos, cansados e famintos e habitaram às ilhargas do território de Agnicaitanya.
A princípio, talvez por algum sentimento assemelhado ao que os humanos chamariam de pena, Agnicaitanya deixou que habitassem às redondezas do seu território e todos viveram um breve período de paz e tranquilidade. Mas logo os forasteiros se recuperaram e, a partir daí, uma grande tensão foi vivenciada pela duas alcateias: houve uma pressão coletiva tácita por parte do grupo de Agnicaitanya para que o mesmo expulsasse ou subjugasse os outros lobos. Os forasteiros estavam cada vez mais à vontade e toda a alcateia temia que o líder deles enfrentasse Agnicaitanya e conseguisse a liderança dos dois grupos.
Agnicaitanya postergou o momento do embate o quanto pode pois, em verdade, estava com medo dos outros lobos, principalmente do que parecia ser o líder deles. Mas ele não podia, em hipótese alguma, demonstrar isso aos demais membros do grupo, tal demonstração de fraqueza acabaria com sua autoridade e traria desordem ao equilíbrio que havia, a muito custo, conseguido impor. O tempo corria, o evento final se aproximava de forma inevitável e Agnicaitanya foi posto no altar do seu dilema, dos seus instintos mais básicos: lutar ou fugir?
Agnicaitanya ponderou as alternativas durante uma brevíssima peregrinação aos arredores do seu território. Andou durante toda a manhã, cruzou o riacho que fica a leste e que, em tempos antigos, dizem que corria pra cima, subindo a montanha e indo congelar no pico das montanhas das Terras Geladas. Descendo o rio, chegou ao emaranhado de rochas que margeia uma pequena sarça que é vista, de tempos em tempos, arder em um belo fogo mágico. Contornando as rochas, cruzou de volta o rio, e o rio lhe pareceu estranho, como se nunca o tivesse cruzado antes. Caminhou por entre matagais banhados de sangue de homens livres e tomou sua decisão. Lutaria, mesmo que perecesse, lutaria, não suportaria a condição de proscrito, a humilhação, a desonra e, por isso, lutaria.
O sol já se punha quando retornou decidido a enfrentar o outro lobo. Olhou onde habitualmente ficavam, mas não encontrou nada, procurou mais um pouco... e nada. Quando ajuntou-se à sua alcateia, foi reportado por eles que os três haviam partido, não sem antes agradecer o voto de confiança e a hospitalidade de Agnicaitanya. Disseram também que, caso um dia necessitassem de ajuda, que uivassem para uma pequena estrela chamada Fobos, guardiã do que sobrou do clã de Proudo, e ela enviaria auxílio.
Essa é uma pequena parte da história de Agnicaitanya, ela me foi narrada pelas ninfas que aparecem, de tempos em tempos, para se aquecer ao redor da pequena sarça ardente.
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